Isaac Warden Lewis
Desde que o
Brasil tornou-se supostamente independente, segundo alguns políticos
pertencentes às classes favorecidas no tempo em que o país era uma colônia de
Portugal, sendo este país também colônia não declarada da Inglaterra e
orientada por interesses capitalistas de países europeus (Inglaterra, França,
Holanda, Bélgica), letrados e políticos luso-brasileiros propuseram reformas e
reformas para inúmeros aspectos institucionais e estruturais da sociedade
brasileira, colonizada antes e depois da proclamação da independência. Nós
sabemos que, para reformar uma casa, é preciso, primeiro, verificar as
condições de moradia da casa, a qualidade de suas estruturas, dos materiais que
compõem o arcabouço do prédio e do solo
em que a casa foi construída, para, depois, sugerir as reformas necessárias
para o prédio a ser reformado.
Acreditamos que,
para reformar itens institucionais e estruturais de uma sociedade, é preciso
observar os requisitos necessários para reformá-los, adotando os mesmos procedimentos
para a reforma de uma casa. Ao não fazerem isso, os políticos e os letrados
acabam repetindo realizações que não mudam nada, como as reformas realizadas no
Brasil Colônia, Brasil Império e no Brasil República até os dias atuais.
Podemos perceber isso nas ações e documentos produzidos por políticos,
militares, juízes, juízas, ministros, secretários de estado etc. nos dias
atuais. Comecemos do início. Em 1494, o papa Alexandre VI (família Borgia)
dividiu as terras a serem encontradas a 370 léguas de Cabo Verde entre o reino
da Espanha e o reino de Portugal. Uma aberração! O rei de Portugal passou a
considerar toda a terra encontrada no território brasileiro como sua. De 1500 a 1822, os funcionários
públicos a serviço de Portugal (governadores, auditores, juízes, militares,
políticos, policiais, padres) foram instrumentalizados para administrar essa
terra e os interesses do rei de Portugal. Os políticos que referendaram a
independência de Portugal fizeram muitos projetos e muitas reformas para o país
independente, porém não aboliram o conteúdo da bula do papa corrupto e nem
devolveram as terras dos indígenas usurpadas pelo rei de Portugal. Também não
aboliram os conteúdos das ordenações que discriminavam negativamente povos nativos
com base em estudos de pseudocientistas europeus. Todas as reformas feitas no
império e na república não surtiram efeitos para os povos descendentes dos
indígenas e dos africanos, de tal sorte que todas as reformas vinculadas às
reformas estruturais, como a da educação, do bem estar da população e de sua
segurança permanecem como letras, somente letras, o que nos faz lembrar um
trecho da peça teatral, “Hamlet”, de William Shakespeare, em que um personagem
pergunta a Hamlet o que ele estava lendo. Hamlet responde: “palavras, palavras”.
Para nós, esse país parece mais um estado burocrático de direito do que um estado democrático de direito. Esse
estado burocrático se orgulha de suas universidades (que mais parecem um
conglomerado de escolas superiores, no dizer de Florestan Fernandes) que produzem
desembargadores/as, juízes/as que se pronunciam publicamente ou elaboram suas
sentenças com base em ideias preconceituosas contidas nas ordenações joaninas,
manuelinas ou felipinas. Os governadores e secretários de segurança do Amazonas
ao Rio Grande do Sul, passando por São Paulo (locomotiva do país!), e pelo Rio
de Janeiro (cidade maravilhosa!), têm sido incompetentes para punir policiais e
políticos que cometem crimes e abusos de autoridade. Houve e ainda há discussão
sobre a necessidade de formação universitária para os jornalistas, porém temos
visto que um bom número desses profissionais consideram as classes política,
militar e policial incapazes de cometerem crimes e injustiças. Jornalistas,
juízes e outros profissionais liberais que expressam ideias do senso comum não precisavam cursar um curso superior. Aos
governadores, juízes, militares, policiais, secretários de estado e
jornalistas, é bom lembrar que no Brasil Colônia, esses funcionários existiam
para perseguir os nativos indígenas, os nativos africanos e os plebeus
portugueses e estrangeiros, enfim todas as classes desfavorecidas, conforme
determinavam as ordenações publicadas pelos reis de Portugal. As caravelas que
saíram de Portugal traziam navegadores e soldados armados para combater gentes
desarmadas, consideradas previamente inimigas do reino português.
Os serviços
públicos do estado burocrático de uma sociedade colonizada precisam ser
analisados de acordo com a filosofia (ou mais precisamente, a ideologia) que
orienta a sua aplicabilidade. A proposta de reformá-los precisa considerar por
que e para quem tal reforma está sendo feita. A primeira questão a ser colocada
é saber se tal reforma será a primeira ou se já houve alguma reforma dos
serviços prestados pelo estado que foi totalmente inócua. Começaremos
perguntando sobre a condição do estado burocrático de direito atual. O Brasil e
o estado do Maranhão, Grão-Pará e Ceará constituíam dois estados ligados
diretamente ao reino português, o primeiro desde 1549, quando da criação do
governo geral, e o segundo quando foi criado em 1619. Estes dois estados tinham
burocracia estatal (governo, câmara de representantes, autoridades militares, jurídicas
e policiais) que existia em função dos interesses das classes privilegiadas
europeias. As classes favorecidas e as classes desfavorecidas deveriam
contribuir com suas atividades para enviar recursos e riquezas para a
metrópole. Os recursos e a riqueza produzidos pelas classes desfavorecidas
nacionais serviam para manter condições e privilégios das classes favorecidas
nacionais e das classes privilegiadas portuguesas. Cabia às classes favorecidas
administrar os aparelhos do estado burocrático de direito em seu próprio favor
e em favor das classes privilegiadas de Portugal. Cabia às classes
desfavorecidas trabalhar, trabalhar, produzir, produzir, para que as classes
favorecidas e as classes privilegiadas usufruíssem o produto do trabalho das
classes desfavorecidas. Quem vai fazer as reformas? Os luso-brasileiros são
confiáveis para fazer reformas para um país que continua colonizado? Talvez
seja hora de os luso-brasileiros consultarem os povos indígenas que já sabiam
administrar os recursos naturais dessa terra muito antes de entrarem em contato
com a pseudo civilização e o pseudocristianismo
trazidos pelos portugueses do século XV, ideias e conceitos remanescentes do período medieval português,
propagado pelos jesuítas a serviço dos colonizadores. É bom lembrar que, no
século XIX, os aprendizes de cientistas do Instituto Histórico e Geográfico
Brasileiro estavam preocupados com o futuro da nação brasileira, considerando
os poucos conhecimentos civilizatórios dos descendentes dos nativos indígenas e
africanos. Eles se esqueceram de
analisar os comportamentos pseudo
civilizatórios dos luso-brasileiros, incluindo os próprios aprendizes de
cientistas. Hoje, os nativos dos descendentes indígenas e africanos podem
realizar a análise esquecida pelos aprendizes de cientistas no século XIX.