sábado, 2 de janeiro de 2021

VIVA FESTAS! VIVA!!!

  Isaac Warden Lewis

 

I

 

As festas atraem muitas pessoas adultas. Algumas pessoas são atraídas por festas desde pequenas. Elas adoram aniversários, natais, anos novos, baladas, carnavais e mais programas nos finais de semana. Desde pequena, Esmeralda Figueira era uma dessas pessoas que adoravam festas. Para ela, um ano deveria ser trezentos e sessenta dias de festas. Sua mãe a matriculara num Jardim de Infância aos três anos de idade para estudar. As aulas no Jardim de Infância “Raios de Luz” resumiam-se em brincadeiras e festas todas as semanas. Quando Esmeralda foi transferida para uma escola aos sete anos para aprender a ler, escrever e contar foi um verdadeiro trauma para ela. Não havia brincadeiras e nem festas. Ela não gostou da escola. Levou três anos para aprender a ler e escrever algumas palavras. Contar tornou-se um desafio acima de suas capacidades mentais. Ela acabou sendo transferida para outra escola para alunos problemáticos. Aos quinze anos, conseguiu terminar as primeiras séries do Ensino Fundamental. Sua mãe foi aconselhada a matricular a filha numa escola noturna para terminar as últimas séries do Ensino Fundamental. Logo Esmeralda mostrou interesse em frequentar a escola noturna. Para ela, os professores e as professoras eram pessoas chatas, só pensavam em passar e explicar matérias e mais matérias. Muitos alunos e muitas alunas só pensavam em estudar, estudar e estudar. Mas havia algumas colegas que se tornaram amigas de Esmeralda. Elas também não gostavam de estudar e muito menos fazer esforços para aprender qualquer coisa. Elas sabiam onde e quando havia festas, baladas, programas divertidos. Esmeralda aprendeu que deveria sempre levar uma blusa extra em sua mochila para ir a essas festas. Esmeralda reencontrou as alegrias dos tempos de jardim de infância. A escola noturna era uma festa. A vida voltou a ser festa, divertimento e alegrias. Houve somente um contratempo no final do ano. Ela e suas amigas foram reprovadas. Teriam de repetir a mesma série no ano seguinte. Isso não preocupou muito Esmeralda Figueira. “Afinal de contas quem precisa saber em que hemisfério fica seu país? Qual a diferença entre um vegetal e um animal? O Brasil foi descoberto ou foi invadido? Como se escrevem tais e tais palavras: com ch ou com x? Como devemos pronunciar palavras escritas com e? Devemos pronunciar escola ou iscola, sequer ou siquer, descobrir ou discobrir? Caxias foi um herói ou um genocida? Por que devemos nos esforçar para entender as coisas, como informavam alguns professores?” Esmeralda parou de pensar. 

II

 

Durante as férias escolares, ela continuou frequentando festas e baladas com suas amigas e com o seu namorado. No retorno às aulas, Esmeralda retomou seu desinteresse pelas aulas, frequentando-as mais para ter oportunidade para sair de casa todas as noites. No primeiro semestre, descobriu que estava grávida. Ela procurou ocultar isso de sua mãe até o dia em que teve de ir a uma maternidade para ter o filho. Seu namorado desapareceu. Sua mãe a condenava constantemente. Assim que voltou da maternidade, Esmeralda ficou algum tempo cuidando do seu filho. Logo ela arranjou desculpas para sair com suas duas amigas, Marcelina Souza e Ingrid da Silva. Todos os sábados e domingos, elas iam a festas. Cansada das admoestações da sua mãe, Esmeralda resolveu deixar sua cidade no interior do Pará, à beira do rio Amazonas. Deixou seu filho Carlos com sua mãe, prometendo que viria buscar o menino na primeira oportunidade. Foi para Belém. Nessa cidade, descobriu os bares da vida, onde se empregou como garçonete, pois além de servir os clientes, ela ouvia e dançava as músicas de carimbó,  sertanejos, e os grandes sucessos de Reginaldo Rossi, Waldick Soriano, Amado Batista. Suas amigas de trabalho eram todas festeiras, os clientes também gostavam de se divertir e de ver futebol na televisão. Assim passaram vários anos. Às vezes, Esmeralda se lembrava que tinha um filho. Escrevia para sua mãe, dizendo que “estava bem empregada e que estava bem. Mandava algum dinheiro para o filho e, assim que pudesse, voltaria para passar férias com a família”. Essas cartas geravam muitas dúvidas e preocupações à mãe de Esmeralda, pois ela já conhecia histórias de muitas moças que deixaram aquela cidade e diziam estar bem empregadas e, de repente, retornavam pobres e envelhecidas precocemente. Esmeralda nunca retornou para passar férias em sua cidade natal. Seu sonho era viajar para São Paulo. Um certo dia, ela conheceu um caminhoneiro no bar. Depois de muitas bebidas e de ébrias conversas, ele se ofereceu para levá-la para São Paulo.  Depois de sete dias de viagem, parando em pequenas vilas para dormirem em pousadas à noite, eles chegaram a uma rodovia paulista e resolveram pernoitar num hotel a cinco horas de São Paulo. Quando Esmeralda acordou às cinco horas da manhã, o caminhoneiro já havia partido. Ele deixou algum dinheiro sobre a mesa. Esmeralda descobriu que ela poderia pegar um ônibus que levaria seis horas para chegar na rodoviária de São Paulo. Perto do hotel, havia um bar que atendia caminhoneiros. Tentou conseguir trabalho no bar. Não havia vagas para garçonetes naquele momento. O proprietário disse à Esmeralda que ela poderia ajudar os clientes, os quais sempre recompensavam as moças. Esmeralda resolveu ficar. Toda noite, ela ia ao bar, beber , conversar, dançar as mesmas músicas que ela já conhecia de outros bares boêmios. Três meses depois, ela conseguiu uma carona com outro caminhoneiro para seguir para a cidade de São Paulo. Essa cidade deslumbou-a. Era o mundo dos mundos. Andou pela cidade por vários dias. Encontrou trabalho em um bar que funcionava à noite. Encontrou outras amigas e se divertia com os clientes, servia-lhes, bebia, conversava e dançava com eles. Conseguiu juntar um dinheirinho. Planejou passar férias em sua cidade natal. Era fim do ano. Numa noite festiva, um caminhoneiro fez-lhe um convite para morar em Manaus com ele, pois ele iria gerenciar uma agência da transportadora nessa cidade. Além do salário, a empresa pagaria o aluguel de uma casa. Esmeralda perguntou ao seu companheiro, Oscarino das Neves, se ela poderia trabalhar e se ele arranjaria um emprego para ela em Manaus. Oscarino lhe disse que, em Manaus, poderiam procurar alguma coisa para ela.

 

III

 

Esmeralda e Oscarino deixaram São Paulo em janeiro. Moraram em um hotel no subúrbio de Manaus. Em fevereiro, conseguiram uma casa no mesmo bairro, perto do escritório da transportadora. A empresa alugou a casa residencial. Esmeralda e Oscarino começaram uma nova vida em uma nova cidade. O novo sempre incorpora o velho, assim como o velho sempre incorpora o novo ou a inovação. Oscarino das Neves também era paraense e conhecia bem o mundo de bares, onde ele sempre parava em suas viagens pelas cidades brasileiras. Apreciava as mesmas músicas e as letras das músicas que Esmeralda tanto apreciava. Nos bares, ele se resumia a ficar sentado, bebendo cerveja e, eventualmente, conversava com seus parceiros e parceiras. Logo a casa residencial do conjunto onde foram morar tornou-se um ponto para bebericar cerveja, conversar ebriamente sobre o tudo ou o nada e ver jogos de futebol na televisão. Isso aconteceu da seguinte maneira. Todos os dias, Esmeralda perguntava ao Oscarino se ele iria conseguir algum trabalho para ela. De tanto ser cobrado, ele sugeriu a ela fazer um restaurante para atender clientes para almoço. Logo o restaurante virou um bar à noite, principalmente, em dias de jogos. Os bebericadores de cerveja e apreciadores de jogos de futebol na televisão tornaram-se clientes preferenciais do bar. Todas as sextas-feiras, sábados e feriados, havia uma programação de músicas características de bares da vida. Ocorriam conversações ébrias, cantorias de músicas bregas. Os participantes  chegavam com seus carros caros somente para se divertir. Os vizinhos denominaram esse bar clandestino de “Pequena Belém”, pois seus frequentadores eram principalmente pessoas paraenses que residiam e trabalhavam em Manaus. Homens e mulheres, entre quarenta e sessenta anos, comportavam-se como adolescentes que não fizeram a transição para a vida adulta. Numa manhã de segunda-feira, um desses frequentadores chegou à casa de Esmeralda para beber. Ela lhe perguntou se havia acontecido alguma coisa. Ele relatou que chegara em sua casa de madrugada e encontrou-a totalmente  vazia. Sua mulher havia ido embora, levou os móveis, levou tudo, incluindo as duas filhas do casal. Esmeralda quis saber o que ele havia feito contra sua esposa. Ele respondeu que não havia feito nada. Ele não sabia para onde ela tinha ido e não sabia como encontrá-la e as filhas. E continuou bebendo e falando de coisas banais que homens e mulheres falam em bares da vida. Esmeralda Figueira lembrou-se de seu filho. Naquele dia, ela escreveu para a mãe. Relatou que estava vivendo em Manaus. Informou que estava bem, morando em uma casa grande, casada com um gerente de uma transportadora. Disse que sentia saudade da família e convidava a mãe e o pai para visitarem-na em Manaus. Escreveu que, no momento, ela não poderia visitá-los porque ela era dona de um restaurante, além disso, tinha de cuidar da sua casa. Disse que ia mandar um dinheiro para mãe e enviava beijos e abraços para todos. Depois disso, começou a varrer e a limpar o ambiente, pois, no dia seguinte, seria feriado e haveria uma festa de aniversário para o homem cuja mulher fora embora com os móveis e as filhas. Ele contratou os serviços de Esmeralda porque ele iria superar as perdas com uma festa e muita coragem. Pediu para Esmeralda providenciar bolos e salgadinhos e que houvesse cerveja para todos e concluiu: “O que seria da vida sem festas!”.

 

Dezembro, 2020.

THE TREE

                                                 Isaac Warden Lewis

 

From the seed buried in the soil,

there appeared a timid, little plant,

which, receiving water and solar rays,

grew and invigorated itself as time passed.

After having lived its infancy and its youth,

it became an adult tree, strong and leafy,

bearing fruits for a long time.

 

As time passed by, the tree stopped to develop itself.

Its leaves stopped to renew themselves

and, sooon, it stopped bearing fruits.

The tree, then, lived quietly at the mercy of the Wind and the Time.

The branches became weak and, now and then, they fell.

And so, the tree went on shedding its leaves and lopping itself.

 

The tree, however, remained standing

and, about it, there were, now, other plants

that were born from the seeds of its fruits.

The mother-tree that, little by little, was desappearing

                             /from the scenery of life,

left the earth full of daughter-trees and granddaughter-trees,

that, in its turn, would recycle life on Earth.

 

 

 

quarta-feira, 2 de dezembro de 2020

O CONTEXTO POLÍTICO SOCIAL EM PAÍSES COLONIZADOS

                                                                                        Isaac Warden Lewis* 

O assassinato do cidadão negro brasileiro,    João Alberto Silveira Freitas, no dia 19 de novembro de 2020, expõe, de maneira contundente, a relação COLONIZADORES VERSUS PAÍSES COLONIZADOS, em especial, no Brasil. A proclamação da independência (1822), a proclamação da abolição e a proclamação da república (1889) não mudaram o estatuto de país colonizado da nação brasileira. Isso porque o modo de produção de produtos agrícolas para exportação continuou sendo o projeto produtivo da sociedade constituída de duas classes: 1) a classe favorecida (cuja maioria é mameluca), encarregada de  administrar e controlar o país como se fosse uma simples feitoria, produzindo produtos agrícolas e minerais para atender a demanda dos países colonizadores e 2) a classe desfavorecida, cuja maioria tem sido obrigada a produzir sob regime de escravidão, de servidão e, agora, “livremente” em favor das classes favorecidas nacionais colonizadas e das classes privilegiadas colonizadoras dos grandes centros econômicos europeus e dos Estados Unidos.

Na independência, a terra usurpada dos índios pelos colonizadores portugueses não foi devolvida aos nativos da terra. A exploração da mão de obra dos africanos escravizados pela força e de seus descendentes não foi devidamente indenizada. A reforma agrária para possibilitar o seu usufruto pela maioria da população nunca foi realizada pelas classes favorecidas, que continuaram a aceitar como legais os conteúdos da bula papal, das ordenações do reino português que consideravam que a terra e o produto dela era monopólio de europeus e de luso-brasileiros. Além disso, o sistema político, jurídico, militar e policial brasileiro continuou perseguindo os nativos dos territórios invadidos da América, da África e da Ásia, como atestam as invasões continuadas das terras indígenas, quilombolas, sendo que os referidos invasores acabam adquirindo o direito à posse dessas terras. Há poucos meses, indígenas e ribeirinhos, moradores na margem do rio Abacaxis, em Borba, no Amazonas,  foram assassinados pela polícia militar. Por acaso, o governador, o secretário de segurança, os policiais foram punidos? O estado indenizou as famílias das vítimas pela barbárie e violência cometidas contra elas e suas comunidades? O sistema político, jurídico, militar e policial (incluindo empresas de segurança particulares) age como força mercenária e miliciana a serviço das classes favorecidas que, por sua vez, estão a serviço das classes privilegiadas de países colonizadores.

A morte de João Alberto Silveira Freitas, as mortes de favelados no Rio de Janeiro e em São Paulo, de índios por policiais, o desrespeito aos direitos das mulheres e de negros nos tribunais mostram que a cultura colonialista prevalece no estado burocrático de direito, constituído para parecer uma “sociedade civilizada”. A educação dos profissionais liberais realiza-se para que os egressos das escolas elementares e superiores assumam cargos para atender as demandas do estado burocrático de direito. Essa educação (com raras exceções) segue o modelo das escolas jesuíticas e universitárias medievais (Coimbra e Salamanca) que formavam letrados (médicos, advogados, engenheiros, policiais, militares, ministros, políticos) para operacionalizar as leis pré-históricas e medievais contidas nas bulas papais e nas Ordenações do reino português.

Por sua vez, que setor da sociedade francesa a empresa Carrefour representa, de fato? Vale lembrar que, na Segunda Guerra Mundial (1939-1945), franceses combateram tanto o fascismo (a Itália) quanto o nazismo (a Alemanha).  Os empresários franceses não deveriam desconhecer o nível inferior civilizatório do estado brasileiro, cujas lideranças políticas e empresariais estão sempre propensas a atenderem os interesses  das classes privilegiadas de países colonizadores e imperiais, perpetuando, desse modo, barbáries, discriminações racial e de gênero contra os nativos de origem indígena e africana. Afinal de contas, os colonizadores franceses invadiram os continentes americanos, africanos e asiáticos adotando as mesmas barbáries e discriminações contra os nativos desses continentes em nome da “civilização” e do “cristianismo”, além de insinuar que estavam propagando os princípios de “liberdade, igualdade e fraternidade”, elaborados pelos revolucionários populares franceses de 1789. Também os empresários franceses sabem que países colonizados, como o Brasil, não possuem burguesia como essa categoria social é entendida na Europa. Esse país tem, na verdade, empreendedores emergentes que se apresentam como burgueses, sem terem a noção de suas responsabilidades como agentes sociais, fundadores de uma nação realmente burguesa. Classe média, por isso, é uma categoria social inexistente, funcionários públicos  se intitulam classe média. O alto número de supermercados de propriedade de empresas estrangeiras, os quais comercializam os produtos agrícolas e industriais na maioria das cidades brasileiras demonstra a incapacidade dos empreendedores emergentes brasileiros para assumirem responsabilidade pelo controle e administração da atividade comercial nacional. A atitude dos administradores franceses em querer reparar o irreparável é até louvável, mas tal atitude seria desnecessária se os empresários franceses (e outros estrangeiros, de modo geral), agissem civilizadamente nos países colonizados, contrapondo-se às atitudes colonialistas pré-históricas e medievais das classes favorecidas luso-brasileiras. Há pouco, autoridades políticas francesas declararam que os terroristas islâmicos eram bárbaros, desumanos e impiedosos. O que essas autoridades teriam a declarar com relação aos colonizadores e colonos cristãos franceses que invadiram territórios da América, da África e da Ásia, praticando barbáries e genocídios?

Vale ressaltar que nos países colonizadores (do século XVI ao XX), como o Reino Unido, a França e os Estados Unidos da América (país frankenstein  que adota política externa imperialista e política interna colonizada), setores significativos da população têm manifestado sua oposição a intervenções militares e empresariais desonestas  em países colonizados. Vale lembrar que, desde a década de 1950, intelectuais e escritores franceses apoiaram corajosamente as lutas anticoloniais realizadas pelos povos americanos, africanos e asiáticos. Nos Estados Unidos, desde a década de 1960, estudantes, professores e intelectuais norte-americanos têm-se manifestado contra a política imperialista e armamentista de seu país.

O assassinato de João Alberto é um episódio lamentável (no dizer do general Hamilton Mourão, formado pela Academia Militar das Agulhas Negras e em academia norte-americana). Na verdade, esse episódio é recorrente e conhecido por índios, negros, brancos, mulatos, mamelucos e cafuzos despossuídos criminosamente pelos colonizadores portugueses e seus descendentes luso-brasileiros. O episódio João Alberto acabou levando parcela significativa da população brasileira às ruas para manifestar sua discordância de práticas racistas, xenofóbicas e de gênero realizadas por setores políticos, jurídicos, empresariais, militares, policiais, desmentindo as declarações do general Hamilton Mourão e do capitão do mato Sérgio Camargo de que, no Brasil, não há racismo, não há crimes ambientais, não há incompetência política e administrativa. Esses senhores seriam capazes de dizer o que, no Brasil, não foi importado? Afonso Henriques Lima Barreto, em seu romance “Triste fim de Policarpo Quaresma”, criou um personagem que queria resgatar a cultura original do Brasil. Efetivamente, somente os conhecimentos indígenas (inclusive, a cultura do banho) são originais e foram desenvolvidos muito antes de os europeus chegarem a esse país. Sabemos que, afora a cultura indígena, os mitos gregos, os mitos romanos, os mitos hebraicos, os mitos europeus, os mitos africanos, as igrejas evangélicas, o culto ao militarismo, a falsa política, tudo isso e muito mais foram importados. Na França, os médicos que atendem africanos, costumam humildemente ouvir e respeitar os conhecimentos dos xamãs africanos antes de realizar procedimentos médicos em seus pacientes africanos. No Brasil, os antropólogos brasileiros  têm dialogado com os indígenas e quilombolas sobre seus conhecimentos tradicionais.

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A POLÍTICA NOS PAÍSES COLONIZADOS

 Isaac Warden Lewis* 

Pessoas de todos os países do mundo estão tendo a oportunidade de apreciar o espetáculo da cultura pseudodemocrática dos Estados Unidos da América do Norte (excluindo o México e o Canadá) em sua eleição presidencial de 2020. Vale dizer que antes de ser um estado democrático de direito, os Estados Unidos são, na verdade, um estado burocrático de direito tal como os países colonizados da América Latina, da África e da Ásia. Podemos entender por que os líderes políticos e militares dos Estados Unidos, a serviço do seu Complexo Industrial-Militar,  utilizaram a força para implantar ditaduras nas Filipinas, na República Dominicana, Guatemala, Argentina, no Haiti, Chile, Brasil etc. ou apoiaram regimes pseudodemocráticos em várias partes do mundo. Para a elite política norte-americana (formada em escolas e universidades, ditas democráticas), esses países tinham de ser a imagem e semelhança dos Estados Unidos: Países com forças armadas fantoches e sistema político, jurídico-policial corrupto para controlar a população nativa, garantindo, desse modo, os interesses  das classes privilegiadas de países colonizadores imperialistas e das classes favorecidas dos países colonizados (incluindo os Estados Unidos).

Essas classes privilegiadas e classes favorecidas são herdeiras dos invasores europeus (espanhóis, portugueses e ingleses) que abandonaram a Europa a partir do século XVI, trazendo, em sua bagagem  bíblias e armas de fogo e a recusa sistemática em aceitar ideias novas sobre o mundo, o universo que haviam sido desenvolvidas a partir do século XV por cientistas como Nicolau Copérnico (1473-1543), Johannes Kepler (1571- 1630), Galileu Galilei (1564-1642), entre outros. Tais ideias científicas refutavam  totalmente as historinhas pré-históricas contidas na bíblia. Os invasores católicos e protestantes trouxeram as novas experiências mercantilistas que vinham se desenvolvendo nos burgos da Europa. Para esses invasores, pobres e ignorantes, o que importava era o lucro. Não lhe importavam tanto os conhecimentos científicos produzidos na Europa quanto os conhecimentos tradicionais dos povos nativos da América, África e da Ásia, a não ser, desvirtuando-os para servir seus interesses mesquinhos. Desse modo as ideias de reforma religiosa, do humanismo, do renascimento, do iluminismo, da revolução inglesa, revolução francesa, do socialismo, foram totalmente amesquinhadas para produzir ideias de democracia, humanismo, cristianismo, civilização totalmente deturpadas, empobrecidas, para beneficiar as classes capitalistas e favorecidas norte-americanas e isso ocorreu também em países colonizados da América Latina, África e da Ásia. Para os colonizadores europeus, civilização era barbárie, democracia era ditadura, participação política era golpe de estado, além de praticarem genocídio, racismo, xenofobia, misoginia e intolerância religiosa. É por isso que os sistemas políticos, jurídicos, militares, policiais, educacionais dos Estados Unidos e dos países colonizados da América Latina, África e Ásia são muito parecidos, produzindo burocratas e letrados que ainda se orientam, profissional e intelectualmente, pelas Ordenações, elaboradas, na Idade Média, por reinos europeus para orientarem e explorarem as populações nativas da América, África e Ásia, com o objetivo de se apropriarem de seus recursos materiais e naturais.

É importante ressaltar que imigrantes de todas as partes do mundo, adeptos de ideias renascentistas, iluministas, revolucionárias, libertárias e científicas também aportaram ao continente americano, o que explica, de certo modo, o desenvolvimento de pensamento crítico em vários setores culturais e artísticos da sociedade norte-americana.

Contrapondo-se aos colonizadores europeus e aos seus herdeiros, os nativos da América, África e Ásia têm empreendido lutas para defender sua terra, vida, cultura, seus direitos, apesar de contarem com armas desproporcionais com relação as armas possuídas pelos europeus. Isso explica os morticínios, as barbaridades e as ações terroristas praticados pelos colonizadores contra os povos (homens, mulheres e crianças) dos territórios invadidos. Do mesmo modo, os setores desfavorecidos dos países colonizadores não puderam impedir que as classes privilegiadas e favorecidas cometessem crimes contra a humanidade nos países invadidos. Contemporaneamente, temos testemunhado setores da população de países colonizadores (Estados Unidos, Reino Unido, França etc.) protestarem contra o envio de tropas militares ou a intervenção de força de seus governos nos países outrora colonizados. 

 

 

 

segunda-feira, 2 de novembro de 2020

O FEMINICIDA

                                                                                                         Isaac Warden Lewis

Marcos Farias caminhava, com certa apreensão, pelas ruas da cidade do Rio de Janeiro. Morava nessa cidade há três meses. Fugiu da Bahia, onde morava e se criara. Enquanto caminhava, lembrou-se do tempo em que ia, com seu pai, à igreja católica de sua cidade do interior. Lembrou-se do que ouvia na missa:

“Ave Maria, cheia de graça/Bendita sois vós entre as mulheres/Bendito seja o fruto de vosso ventre...”

“Aleluia, aleluia, aleluia/Aleluia, aleluia, aleluia/Aleluia, aleluia, aleluia...”

“Santa Maria, mãe de deus/Rogai por nós, pecadores/Agora e na hora da nossa morte, Amem”.

Marcos Farias não tinha certeza se essas eram as palavras que ouvia e não sabia o que tais palavras significavam. Ele continuou caminhando. Lembrou-se que seu pai deixou de frequentar a igreja católica e passou a frequentar uma igreja protestante, que todos chamavam de igreja dos crentes. Lembrou-se das histórias que o pastor contava:

“No início, havia  somente o caos. Então, deus resolveu criar o mundo e as coisas que há nele. Em seis dias, ele criou a Terra, o mar, o céu, as estrelas, o sol, a lua, as plantas, os animais e fez o homem a sua imagem. Ele gostou do que ele havia criado e resolveu descansar no sétimo dia. Percebeu que o homem parecia triste e solitário. Então, deus resolveu criar uma mulher para fazer companhia ao homem. Ele fez o homem dormir profundamente e retirou uma costela dele para fazer uma mulher. Quando o homem acordou, ele viu que deus havia lhe dado um presente. A mulher estava deitada ao seu lado. Deus disse ao homem que a mulher fora criada para lhe servir e lhe obedecer. O pastor dizia que essa era a história do nascimento do primeiro homem e da primeira mulher.

 

Marcos Farias nunca entendeu bem essa história, pois se tudo era caos, quem criou deus? Ele perguntou ao pai, que não soube lhe responder. Seu pai continuou a frequentar os cultos na igreja dos crentes e sempre o levava para ouvir aquelas histórias meio esquisitas.  Marcos Farias continuou caminhando. Lembrou-se de outra história relatada pelo pastor.  Nessa história, ele ficou sabendo que:

 “o nome do primeiro homem era Adão e o nome da primeira mulher era Eva. Adão e Eva viviam no melhor dos mundos possível. O mundo era um paraíso. Disse que deus havia falado para Adão viver à vontade e feliz nesse paraíso, porém proibiu ele de comer uma fruta de uma árvore. Disse que Adão e Eva e todos os seus descendentes seriam castigados severamente. O pastor disse que Adão era muito obediente, porém a Eva era diferente. Ela era curiosa, muito curiosa. Então, um dia, uma víbora, percebendo a fragilidade e a instabilidade da mulher e sabendo que deus não queria que o homem e a mulher comessem da fruta da macieira porque eles seriam tão inteligentes e autossuficientes como qualquer divindade, resolveu oferecer uma maçã à Eva, dizendo-lhe que ela teria mais poder do que deus e de qualquer homem. Curiosa, Eva comeu a maçã, gostou da fruta, ficou alegre e resolveu apanhar uma fruta para dá-la ao Adão. O primeiro homem era tão inocente que não percebeu que sua companheira fora enganada pela víbora astuciosa, então, ele comeu a maçã. Logo que deus tomou conhecimento da desobediência de Adão, expulsou ele e sua companheira do paraíso para que a humanidade sofresse para sempre sobre a face da Terra.  Por causa da mulher, o homem sofre até hoje”. 

Marcos Farias ficou com algumas dúvidas. Fez algumas perguntas ao pai: “Queria saber se alguma vez houve um paraíso em algum lugar da terra ou do céu? Também queria saber se alguma vez o homem foi um ser inocente? Por fim, queria saber se era verdade que os homens e as mulheres eram deuses pelo fato de Eva e Adão terem comido a fruta proibida?” Seu pai respondeu que não sabia as respostas para essas perguntas.

Marcos Farias continuou a caminhar e a pensar nas histórias que o pastor da igreja dos crentes contava. Começou a pensar se essas histórias eram verdadeiras ou eram invenções antigas para enganar crianças ingênuas, adultos ingênuos, homens ingênuos, mulheres ingênuas. Quem ganha com essas histórias? Os homens? Quem perde? As mulheres. Em todas as histórias contadas pelo pastor, deus conversa somente com os homens. Ele nunca se dirige às mulheres. Estranho, muito estranho! Será que julguei mal minha mulher? Marcos Farias lembrou-se que conhecia sua esposa desde que eram crianças. Brincaram juntos. Cresceram, começaram a namorar, casaram. Tiveram dois filhos. Há algum tempo, Margarida Moraes começou a querer sair com as amigas, ir a festas, parou de me obedecer, começou a discutir, ela só não me batia porque eu mostrava a ela que eu mandava em casa, que eu era o macho da casa e que ela tinha de me obedecer. Como Eva que se deixou influenciar pela víbora, ela começou a deixar-se influenciar pelas colegas de festas. Cada dia, cada noite, ela me irritava pelo prazer de me irritar. Lembrei-me de outra história contada na escola por uma professora que era crente. Ela não sabia ensinar português, matemática, história, geografia, ciências. Só gostava de contar ou ler histórias da bíblia. Essa professora contou a história de “Sansão e Dalila”. Ela relatou que:

“Sansão era um homem forte, bonito, bom, um grande guerreiro, um herói. Todas as mulheres gostavam dele. Quando seu país entrava em guerra com outros países, Sansão se destacava. Ele derrotava muitos inimigos. Dalila era uma moça muito bonita, astuta, uma víbora, que vivia em um país inimigo. Dalila gostava de Sansão. Ela começou a conversar com ele. Os inimigos convenceram Dalila a descobrir com Sansão o seu ponto fraco. Dalila, então, fingindo gostar muito de Sansão, perguntava a ele qual era o segredo de sua força, de sua virilidade. Sansão sempre dava uma resposta qualquer para Dalila. Ela, então, contava para os inimigos o segredo relatado por Sansão. Uma hora, Sansão dizia que seu segredo estava na sua lança. Os inimigos roubaram a lança de Sansão e atacaram seu país. Surpreendentemente, Sansão continuou com a mesma força e valentia sem a sua lança. Os inimigos ficaram com raiva de Dalila e ela ficou zangada com Sansão. Ela fez a paz com ele quando ele revelou que a sua força estava num bracelete que ele usava. Dalila foi correndo avisar aos inimigos que roubaram seu bracelete. Os inimigos invadiram o seu país e Sansão liderou seus companheiros, lutando como um leão. Os inimigos ficaram decepcionados com Dalila e ela ficou irritada com Sansão. Disse a ele que não gostava mais dele. Para não perder a bela Dalila, ele acabou revelando que sua força estava em seu cabelo que ele deixava crescer. À noite, quando Sansão foi dormir, Dalila cortou o seu cabelo e levou as mechas para mostrar aos inimigos. E disse-lhes que toda a força de Sansão estava em seus cabelos que, agora, pertenciam a ela. Os inimigos invadiram o país de Sansão. Ele e seus companheiros lutaram muito. Sansão foi perdendo sua força durante o combate e os inimigos dominaram o país. Essa desgraça ocorreu porque Sansão se deixou dominar por uma mulher”. 

Marcos Farias já havia ouvido essa história na igreja dos crentes, pareceu-lhe que a história contada pela professora era diferente da história contada pelo pastor. Ele ficou calado, não fez perguntas. Pareceu-lhe que a  professora  apreciava mais as proezas dos homens e menosprezava os esforços das mulheres. Pensou que fora injusto com Margarida. Ela queria se separar e ele não aceitava a separação.  Por que a matou covardemente com onze facadas? Agora os filhos não têm mãe nem pai. O que acontecerá agora? Marcos Farias pensou o que iria fazer:

“ Vou tentar chegar a Roraima ou ao Amapá. Vou atravessar a fronteira, vou trabalhar em algum garimpo. Não sei se vou voltar para Bahia algum dia. Não sei se verei meus filhos novamente. Vou com o Paulo. Ele também tem de fugir. Ele espancou a esposa. Quase a matou. Ela está internada. Somos dois covardes. A religião nos ensina coisas falsas e erradas sobre as mulheres. Os crentes são gentes ignorantes. Pobre Margarida! Me perdoe!”.

 

Manaus, outubro, 2020.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 





SENTIMENT OF PLANT

                                                                                                  Isaac Warden Lewis

 

To be like a plant that, living peaceful,

takes advantage of the elements

which are around it

It faces the inclemencies calmly.

It resists against parasites.

It shelters its guests.

It works to produce its own food.

It grows and multiplies itself,

providing, in this manner, benefices

to the earth and to life.

It bears flowers to gladden the world.

It yields fruits in order that other can gather them..

It produces shade for those who seek its protection.

It lives quietly

and lets others concern themselves with their living.

It irradiates, with its green colour, the calmness

and the placidity of a existence that is lived

without the afflictions that characterize animal life.

COSMIC HUMANITY

 Isaac Warden Lewis

 Originating from the comic dust,

Mankind is just a living being

That crawls upon the Earth.

He is hungry and thirsty.

He defecates and urinates.

He dresses and shelters himself.

He works and rests.

He loves and hates.

He laughs and cries.

He looks after his children.

He teaches his youth.

He takes care of his patients.

He buries his dead.

He looks forward to live among his fellows.

He searches explanations of the universe and life.

He invents and destroys things.

He succeeds and makes mistakes.

He improves his outcomes and corrects his mistakes.

He stores and renews knowledges in his brain.

He believes and doubts.

He thinks and dreams.

He hopes and fears.

He wishes to live forever.

He dies after becoming tired of all these things,

Returning do the cosmic dust

To feed minute living beings.