segunda-feira, 1 de agosto de 2016

A FEIRA DAS VAIDADES


                                                                   Isaac Warden Lewis
Alguns animais reuniram-se para discutir qual era o animal que se distinguia de todos os demais. O primeiro a se manifestar foi o pavão. Depois de exibir a sua plumagem pela milésima vez, declarou:
– Um pavão distingue-se de todos os outros animais por suas penas lindas e vistosas.
Um leão dirigiu-se para um ponto alto, olhou para o norte, olhou para o leste, olhou para o sul e, por fim, olhou para o oeste. Enquanto olhava para cada um desses pontos, exibia a sua juba. Declarou, então:
– Um leão distingue-se de todos os outros animais por sua juba grandiosa e pujante.
Uma zebra caminhou alguns passos e ficou de frente para o grupo, virou-se para o lado direito, ficou de costas e, depois, virou-se para o lado esquerdo e declarou:
– A zebra distingue-se de todos os outros animais por suas listras perfeitas e inconfundíveis. 
Um elefante afastou-se do grupo, moveu a sua tromba para o alto e para baixo, girou-a, foi até o rio, encheu a tromba de água, voltou para perto do grupo, esguichou a água sobre os outros animais para refrescá-los. Então, declarou:
– Um elefante distingue-se de todos os outros animais por sua tromba singular e de mil e uma utilidades.
Uma girafa dirigiu-se até uma árvore alta, tirou algumas folhas, mastigou-as, olhou para o mar a leste, olhou para o planalto a oeste, olhou para as montanhas ao norte, olhou para a planície ao sul e comunicou ao grupo que iria chover mais tarde. A seguir, declarou:
– A girafa distingue-se de todos os outros animais pelo seu pescoço majestoso e belo.
Um rato levantou-se, aspirou o ar, fingiu tossir, disse que o tempo estava mudando e declarou:
– Um rato distingue-se de todos os outros animais pela sua capacidade de sobreviver a todas as doenças e condições de vida desfavoráveis. 
Um índio americano levantou-se e começou a se pintar. Utilizou-se de vários tipos de tintas para dar coloridos diferentes às diversas partes do seu corpo. Depois, declarou:
– O homem distingue-se dos outros animais pelas magníficas pinturas que faz no seu corpo.
Um negro africano levantou-se e começou a exibir as suas vestes feitas de penas de aves variadas e declarou:
– O homem distingue-se dos outros animais por causa de suas vestes feitas de formosas penas.
Um inglês, que primordialmente se dizia inglês, secundariamente se dizia homem e, em último caso, europeu, exibiu seus trajes ocidentais e declarou:
– Um cavalheiro ou uma dama distingue-se dos outros animais por sua vestimenta elegante.
Um macaco, que comia sua milésima banana, saltou numa árvore, pulou de um galho para  outro, subiu no ramo mais alto, olhou para além do horizonte percebido pelos outros animais, olhou em todas as direções, desceu da árvore, aproximou-se do grupo e disse:
– Cada animal exibe suas idiossincrasias.
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Do livro Educação no reino de Banan e outras fábulas.     

terça-feira, 19 de julho de 2016

OS IDEAIS DA REVOLUÇÃO FRANCESA


                                                                              Isaac Warden Lewis

O mundo todo tomou conhecimento da magnífica comemoração dos duzentos anos da Revolução Francesa. A história dessa revolução tem-nos oferecido, fundamentalmente, duas versões que são, na verdade, as duas faces dessa mesma história.
A primeira versão é a oficial, geralmente, ensinada nas escolas e transmitida pelos meios de comunicação. Ela nos informa que a Revolução Francesa foi realizada com o objetivo de estabelecer princípios universais aplicáveis a todos os homens, independentemente de sua condição social, sua raça ou sua religião. Tais princípios afirmam que todo homem tem direito à vida, à liberdade e à felicidade. As três palavras de ordem – liberdade, igualdade, fraternidade – resumiriam, nessa versão oficial, os ideais da Revolução Francesa.
A outra versão é a extraoficial, menos conhecida do grande público, diz que a Revolução Francesa, na verdade, continha, dentro dela, várias revoluções, uma vez que classes diferentes e até antagônicas participaram ativamente da derrubada das instituições do regime feudal. Logo após a efetivação desse objetivo, as duas classes vencedoras se digladiaram para estabelecer o governo e as instituições que melhor atenderiam os seus respectivos interesses. Infelizmente, o proletariado sofreu vários golpes e a burguesia criou governos e instituições em seu próprio benefício.
 
O problema, agora, é tomarmos uma posição em relação a uma dessas versões, ou seja, estabelecermos qual das duas seria a mais verdadeira, já que os defensores de cada uma dessas versões consideram a sua como a verdadeira. Acreditamos que a experiência histórica nos ajudará a nos definirmos por uma delas.

Todos nós sabemos que os historiadores, de modo geral, referem-se ao período do terror da Revolução Francesa em que inúmeras pessoas foram condenadas à morte, principalmente, reis e rainhas.

Inegavelmente, esse período reflete as lutas intestinais da revolução em que setores conservadores e setores progressistas lutavam radicalmente para fazer valer a sua interpretação do que entendiam por democracia, fraternidade, igualdade, liberdade etc.
 
No final desse período, emergiu vitorioso o governo de Napoleão Bonaparte que representou, na verdade, a vitória dos interesses da classe mais poderosa e mais bem organizada naquele momento – a burguesia francesa.

A outra etapa da história da Revolução Francesa é a propagação dos ideais dessa revolução em todo mundo. Ou seja, a burguesia vitoriosa inicia a guerra aos regimes feudais da Europa, tentando revolucionar os sistemas políticos vigentes nos países daquele continente. Nos outros continentes – África, América e Ásia – a burguesia francesa empreende algumas conquistas, em busca de matérias-primas para a sua indústria nascente e criando, nessas colônias, mercado para os seus produtos industrializados. A todos os continentes, a burguesia francesa vitoriosa levou os seus ideais, ou melhor, a sua interpretação dos ideais de liberdade, igualdade e fraternidade para todos os homens.
 
Como exemplo, veremos como a França democrática operou, de modo geral, esses ideais, em suas colônias, na África, no século XIX. Os franceses desembarcaram em várias regiões daquele continente, com armas modernas, eliminaram milhares de africanos negros, tomaram as melhores terras, criaram cidades europeizadas e urbanizadas para os franceses brancos, apropriaram-se dos recursos naturais dessas regiões e marginalizaram os habitantes naturais, que passaram a viver na periferia da cidade, como cidadãos de segunda classe e como mão-de-obra explorada, segundo os interesses dos colonizadores.
Esse exemplo, é claro, foi seguido pela Grã-Bretanha, uma das grandes nações democráticas burguesas do século XIX. Tanto que esses dois países entraram em guerra várias vezes para decidir a quem caberia impor os tais ideais e interesses burgueses, nas colônias da África, América e da Ásia. No século XX, os Estados Unidos constituem o exemplo perfeito de vitória dos interesses e dos ideais da burguesia internacional em todo mundo.

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Do livro “Educação: doutrinação ou desvelamento?”   








domingo, 3 de julho de 2016

DESAMOR FILIAL

                                                                      Lucilene Gomes Lima

O filho se comunica com a mãe após um longo período de indiferença:
-Alô,  mãe, como estão as coisas por aí?
-Tá tudo no mesmo. Vou vivendo como Deus permite. – ela começa então a descrever seu calvário. Mas o filho não está muito disposto a ouvir a mãe se lamuriar, o que ele quer, realmente, é contar uma novidade:
- Mãe,  comprei um peixe muito bonito. Deve  pesar uns dez quilos. Ainda estava vivo quando comprei.
- Puxa, já faz tempo que eu não como peixe – a mãe se alegra.
- Vou levar um pedaço para a senhora. Só vendo como o peixe é bonito!
- Já estou até sentindo o gosto. Se você pudesse trazer também os temperos... Não tenho quase nada aqui para temperar.
- Hoje mandei a mulher preparar ao molho de leite de coco e amanhã vou mandar preparar com um molho especial de legumes. Mas o peixe é tão bom que a senhora pode comer só com água e sal. Eu vou lhe levar um pedaço.
- Estou esperando, filho, Deus lhe abençoe.
Três dias depois, o filho volta a telefonar para a mãe. Conversam algumas banalidades. Ela faz, como de hábito, seus queixumes, mas o filho não menciona o peixe. Ela tenta lembrá-lo:
- E o peixe? Estava bom mesmo?
- Estava gostosíssimo. O peixe mais gostoso que já comi.
- Quando você vai trazer o pedaço para eu provar – ela cobra.
- Ah, mamãe! O peixe é tão bom que nós comemos até lamber os dedos. Ainda sobrou uma parte. A senhora gosta da costela?
- Gosto, sim.
- Então, vou levar para a senhora.
- Tá bom. Vou ficar esperando. Deus lhe abençoe.
Passam-se mais três dias e o filho nada de aparecer, a mãe insiste:
- Alô. E então? E a costela?
- Que costela? Ah, é a senhora, mãe.
- Você esqueceu de trazer a costela do peixe?
- Ah, mamãe! Aquele peixe era muito gostoso! Comemos e ainda ficamos com água na boca. Só sobrou a cabeça.
- É mesmo? – ela pergunta tristemente.
- A senhora quer a cabeça? Dá para fazer um caldo, não dá?
- É... dá.
- Então, eu posso levar para a senhora?
- Pode. Quando?
- Amanhã eu levo. Tchau.
- Tchau. Deus lhe abençoe.
Passaram-se dias, semanas e a mãe ainda não recebeu aquela cabeça de peixe.
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Do livro "O julgamento e outras histórias" 

sábado, 2 de julho de 2016

O TRABALHO DO PADEIRO

                                                                                                       Isaac Warden Lewis
 

Para fazer pão,
primeiro, o padeiro tem de preparar a massa.
Para prepará-la,
ele tem de juntar e mexer farinha, água e fermento.
Para fazer isso,
ele precisa ter esses produtos.

Isso implica dizer que:
alguém plantou trigo e alguma indústria transformou-o em farinha;
alguma companhia tratou e processou a água da natureza,
alguém fabricou o fermento.

Também, antes de começar a fazer pão,
ele tem de acender o forno.
Para acender o forno,
ele tem de colocar lenha nele.
Antes disso, ele tem de rachá-la
e carregá-la para o forno.

Depois disso tudo, é que ele coloca a massa no forno.
E faz o pão que eu e você comemos.
É simples, não é?

Mas, antes de poder fazer o pão,
o padeiro precisa aprender a fazer pão.
Também para fazer pão todos os dias,
ele precisa ter prazer em fazê-lo.
E para ter esse prazer,
ele precisa ser bem remunerado
para poder viver condignamente.
Pois, nem só de pão vive o padeiro.
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Do livro "Sentimento e consciência"

 
 
 
 
 
 

quinta-feira, 2 de junho de 2016

DESVIO DO PARTIDO DOS TRABALHADORES: A RAIZ DO PROBLEMA


                                                               Isaac Warden Lewis

 
O país chamado Brasil consolidou uma série de contradições e confusões temáticas e conceituais difíceis de serem corrigidas. Esta terra começou sendo chamada de ilha de Vera Cruz. A terra não era uma ilha e a cruz não era vera. Depois, chamou-se Terra de Santa Cruz. Esse nome também não vingou porque a cruz não era santa. Não havia e nunca houve documento divino provando que esta terra deveria pertencer a Portugal. Essa nação propagou, então, que descobrira uma terra que passaria a ser chamada Brasil. Que descoberta era essa onde viviam povos nativos há mais de mil anos antes de os europeus chegarem à América (outro nome problemático)? Para piorar as coisas, chegaram com os invasores portugueses ordens religiosas (jesuítas, principalmente) que nada sabiam sobre cristianismo. Ensinavam, na verdade, cristianismo às avessas porque, na Europa, estudiosos questionavam os dogmas cristãos e produziam conhecimentos científicos que desqualificavam qualquer conhecimento religioso. Mas, para os nativos, os africanos e os portugueses analfabetos e ignorantes, o ensino jesuítico era considerado farol da civilização. A partir desse ensino precário, mas satisfatório para os colonizadores e exploradores dos indígenas e dos negros, os filhos de senhores e senhoras escravagistas iam a Portugal estudar Direito, que não consistia em estudar ciências jurídicas e, sim, aprender a operacionalizar as leis manuelinas e joaninas, favoráveis à escravização e discriminação negativa de índios e negros africanos e seus descendentes. Havia, naturalmente, exceções, como, por exemplo, Gonçalves Dias, mas a maioria dos formados nessas escolas eram somente operadores das leis estabelecidas em favor das classes privilegiadas e favorecidas de Portugal e do Brasil, ou seja, traficantes, senhores e senhoras escravagistas, incluindo reis, rainhas e a corte.

No Brasil Império, as contradições e as confusões temáticas e conceituais continuaram. O Brasil torna-se independente. Mas, como? Os brasileiros ou o povo brasileiro lutou para se tornar independente de Portugal? Não, o regente D. Pedro declarou sua independência com relação às cortes portuguesas. Depois da revolução francesa (1789) que aboliu o absolutismo dos reis, como Luís XIV, que dizia “o estado sou eu”, os brasileiros aceitaram o fato de que o Brasil era independente sem luta revolucionária. Claro que os brasileiros, nesse caso, eram os traficantes, os senhores e as senhoras escravagistas e seus filhos letrados, a maioria, operadores das leis manuelinas e joaninas que, agora, passariam a ler os manuais e as apostilas de segunda mão da burguesia vitoriosa na Inglaterra e na França. Embora houvesse um grande número de advogados formados nas faculdades de Direito de São Paulo e de Olinda, os cientistas jurídicos eram poucos, como, por exemplo, Castro Alves, Rui Barbosa, Antônio Bento, Saldanha Marinho e outros em várias províncias do Brasil. O diploma possibilitava a esses letrados empregos nos órgãos públicos. Essa era a expectativa dos senhores e das senhoras escravagistas para os seus filhos ou afilhados. Nesse período, senhores e senhoras escravagistas, seus descendentes e agregados, a maioria constituída de mamelucos, viam-se como europeus. Macaqueavam-se física e espiritualmente, pretendendo serem europeus, civilizados, cristãos, embora não tivessem noção exata do que era ser europeu, civilizado, cristão. Além disso, esses senhores e essas senhoras, analfabetos, ignorantes, preguiçosos, em sua maioria, ambicionavam conquistar títulos de nobreza. Vários barões, marqueses, duques conquistaram seus títulos por terem massacrado índios e negros desarmados. O Brasil era um império às avessas. Era um império de papel. Para quem leu a história do império persa, romano ou britânico, por exemplo, fica difícil entender que império era esse constituído no Brasil. Oficialmente, o Brasil constituiu-se através de proclamações. O rei de Portugal proclamou aos quatro cantos da terra que os portugueses descobriram o Brasil. D. Pedro proclamou a independência. A república brasileira também não resultou de luta do povo para fundar uma república. Os senhores escravagistas resolveram proclamar a República. Ponto final.

A decisão dos senhores e das senhoras escravagistas ocorreu um ano após a proclamação (outra)! da abolição da escravidão. Essa abolição trouxe um problema anunciado para as classes privilegiadas e favorecidas. O que fazer com milhares e milhares de índios e negros vagando pelo Brasil? Em 1850, os escravagistas estabeleceram que a aquisição de terras no Brasil só poderia ser feita através de compra. Mesmo assim, milhares de índios, negros, cafuzos, pardos, mulatos, brancos, mamelucos ocuparam terras devolutas, distantes, em todas as províncias brasileiras desde o período colonial. Os fazendeiros mamelucos começaram a imaginar uma república europeia nos trópicos. Trouxeram europeus de verdade – italianos, portugueses, espanhóis, suíços para trabalharem em suas terras, mas, ao invés de se irmanarem com os brancos europeus, trataram-nos como escravos. Esses europeus não gostaram de tal tratamento. Os italianos – os rebeldes mais organizados – passaram a combater a escravidão, a exploração dos trabalhadores, propor reformas e revoluções. Os fazendeiros e os seus letrados (chefes de polícia, juízes, operadores de leis) descobriram horrorizados que os imigrantes eram politizados – comunistas, anarquistas, socialistas, sindicalistas combativos. Prenderam milhares desses imigrantes. Colocaram-nos em um navio e devolveram-nos para as suas pátrias. No século XIX, os escravagistas tiveram uma experiência similar na Bahia. Trouxeram da África negros muçulmanos. Descobriram horrorizados que tais negros eram rebeldes e que pretendiam fundar uma república negra muçulmana na Bahia. Mais horrorizados ficaram, ao descobrirem que tais negros sabiam ler e escrever em várias línguas. Prenderam-nos, castigaram-nos e devolveram-nos para África.

Enfim, os letrados mamelucos importaram textos sobre positivismo e darwinismo social de segunda mão, já superados, da Europa (digo, da Inglaterra e França), mas ainda em vigor nas colônias mais atrasadas, como Austrália, países da África, Estados Unidos (país independente, porém ideologicamente alinhado com países escravagistas), Alemanha (onde vigorava o idealismo medieval e antirrevolucionário de Kant e Hegel) e apropriados por mentes doentias em todas as partes do mundo. Esses letrados mamelucos perguntavam-se que país o Brasil deveria ser: Brasil europeu, Brasil africano ou Brasil ameríndio? Respondiam essa pergunta, desqualificando e discriminando negativamente negros e índios e concluíam com as afirmações já contidas nas leis manuelinas e joaninas. O Brasil deveria ser branco puro e índios e negros deveriam ser apartados. Os operadores de direito e os legisladores encontraram uma maneira de inventar um “estado burocrático de direito” e o denominaram “estado democrático de direito”. Nesse estado, tudo funciona às avessas. Todos têm direitos e, ao mesmo tempo, nem todos têm direitos. A lei deve ser para todos, mas nem todos devem necessariamente obedecer às leis. A Constituição é para todos, mas nem todos são regidos por essa Constituição. Os operadores das leis e do direito acham isso maravilhoso, pois podem enunciar, quando acham oportuno e conveniente, que “o Brasil é um estado democrático de direito”. E tudo se passa como se isso fosse verdade, mesmo com inocentes presos e criminosos soltos de acordo com a Constituição, o Direito, a Democracia etc, etc, etc. Num tribunal brasileiro, o honesto torna-se desonesto e o desonesto torna-se honesto.

Se é difícil entendermos certos temas, certos conceitos políticos nesse país, como entendermos o que sejam socialismo, esquerda, direita, democracia, burguesia, pequena burguesia, proletariado quando expressos por certos jornalistas, letrados de gabinete e oportunistas políticos. Como entendermos a insistência desses letrados em chamar o Partido dos Trabalhadores de partido de esquerda ou de partido socialista? O papel de um ativista político, de um intelectual engajado com a verdade, é o de esclarecimento não só de si mesmo como de seus contemporâneos. Nas linhas anteriores, tentamos mostrar que os letrados, no Brasil, sempre distorceram os sentidos, os significados de temas, ideias e conceitos. No período colonial, os jesuítas diziam-se cristãos, mas não se comportavam como cristãos. Ensinavam um cristianismo que permitia a desqualificação, a discriminação negativa e a exploração de índios e de negros. No Brasil império, os operadores das leis defendiam os interesses dos senhores e das senhoras escravagistas e se consideravam civilizados. Para entendermos as distorções do Brasil república, precisamos confrontar os significados de termos repetidos constantemente, como pátria, república, democracia, direito, igualdade, constituição, ordem e progresso etc, etc, etc.

Além disso, precisamos entender que, no Brasil, país capitalista periférico ou de segunda categoria, as classes sociais são emergentes, o que significa dizer que as classes emulam ou querem se parecer com as classes de países capitalistas centrais. A burguesia, a pequena burguesia, a classe média e até a classe proletária são classes emergentes. A ânsia das classes emergentes dos países periféricos é não só parecerem com as classes correspondentes nos países centrais, mas terem a riqueza e o poder que essas classes detêm em seus países. É por isso que os líderes periféricos se parecem tanto. Os líderes políticos e os intelectuais orgânicos dos países da África e do Brasil se parecem tanto. Ao assumirem o poder político de um país, fazem a mesma coisa que os seus antecessores antagônicos faziam. Envolvem-se em corrupção, em mentiras, consideram-se donos do país e comportam-se como se os cidadãos fossem seus súditos.

Os líderes que se dizem socialistas, revolucionários, tanto nos países africanos quanto no Brasil, esquecem rapidamente postulados básicos para transformação qualitativa da sociedade em que vivem. O primeiro postulado que esquecem é que os capitalistas (por conseguinte, o capital e o capitalismo) são fundamentalistas. Os projetos dos capitalistas não são conciliatórios e nem buscam a harmonia entre as classes. As propostas educacionais, políticas, trabalhistas, sociais, financeiras e de seguridade social são bem claras e visam a concentração de renda de poucos e a pauperização da maioria da população.

O projeto educacional, por exemplo, proposto pelo governo da Ditadura Militar (1964-1982), imposto pelo Acordo MEC-USAID, nas reformas de 1968 e de 1971, visou expandir educação de má qualidade em todos os níveis de ensino, mais precisamente a precarização do ensino, a privatização do ensino superior, tornando esse setor educacional formador de operadores e técnicos em todas as áreas profissionais sem exceção para atender os interesses do mercado, reservando aos países centrais a produção científica qualificada. As exceções existem. Há cientistas indianos, chineses, judeus, brasileiros trabalhando nos países centrais. O governo do Partido dos Trabalhadores, mais do que os governos anteriores, adotou e aprofundou os projetos de precarização do ensino em todos os níveis e de privatização do ensino superior.

Todos os projetos políticos adotados pelo governo do Partido dos Trabalhadores, principalmente depois da expulsão dos socialistas fundamentalistas de seus quadros, foram projetos conciliatórios, assistencialistas, cooperativos e condescendentes com os interesses de grandes grupos financeiros internacionais e nacionais. Ao assumirem o poder, os políticos do Partido dos Trabalhadores não questionaram os projetos políticos adotados pelos governos civis após o Governo Figueiredo. Não fizeram nada de novo, nem em relação à corrupção e aos desvios teóricos já praticados tão bem por socialistas e revolucionários de países africanos. Por que, então, os intelectuais de gabinete, os jornalistas e os oportunistas políticos insistem em chamar o Partido dos Trabalhadores de partido de esquerda? Esquerda de onde?

Precisamos respeitar os anarquistas, os comunistas, os socialistas italianos e brasileiros presos, condenados e até mortos por essa república desde o início de sua proclamação. Entendemos que o Partido dos Trabalhadores, mais do que qualquer partido de direita, abriu as portas para a Direita e fechou as portas para a Esquerda. É, por conseguinte, um partido contrarrevolucionário.   

terça-feira, 3 de maio de 2016

O PRESENTE DAS PLANTAS

                                                             Isaac Warden Lewis
       Quando o jardineiro deseja um jardim,
       escolhe um terreno, ara-o e aduba-o.
       Depois, seleciona as sementes e planta-as.
        Quando nascem as plantinhas,
        ele lhes dá água e amor.
        E vai podando-as carinhosamente.

        Em retribuição à sua dedicação,
        as plantas dão-lhe as flores
        e o jardim que ele desejou.
                                    
                    

segunda-feira, 4 de abril de 2016

OS APARTADOS NO BRASIL IMPÉRIO

 

 

Escrito por Isaac Warden Lewis, é uma narrativa ficcional que apresenta a resistência dos negros africanos e seus descendentes à escravidão nesse período da história da sociedade brasileira. Negros e negras protagonizam reações e revoltas, discutem e analisam os fatos sociais e políticos da escravidão, empreendem lutas para sobrevivência digna nos agrupamentos, constituídos a partir das fugas, com apoio de índios. Nas cidades, negros livres organizam associações que protegem escravos fugitivos, contando com apoio de vários setores da sociedade, como escravos, trabalhadores livres, homens e mulheres, escritores e escritoras, advogados, jornalistas e até de juízes. Os apartados no Brasil Império resgata a história de africanos e seus descendentes que se portavam digna e humanamente, apesar das condições adversas criadas por traficantes, senhores e senhoras escravagistas que se orientavam por falsos conhecimentos científicos e cristãos.