O
filho se comunica com a mãe após um longo período de indiferença:
-Alô, mãe, como estão as coisas por aí?
-Tá tudo no mesmo. Vou vivendo como Deus permite. – ela começa então a descrever seu calvário. Mas o filho não está muito disposto a ouvir a mãe se lamuriar, o que ele quer, realmente, é contar uma novidade:
- Mãe, comprei um peixe muito bonito. Deve pesar uns dez quilos. Ainda estava vivo quando comprei.
- Puxa, já faz tempo que eu não como peixe – a mãe se alegra.
- Vou levar um pedaço para a senhora. Só vendo como o peixe é bonito!
- Já estou até sentindo o gosto. Se você pudesse trazer também os temperos... Não tenho quase nada aqui para temperar.
- Hoje mandei a mulher preparar ao molho de leite de coco e amanhã vou mandar preparar com um molho especial de legumes. Mas o peixe é tão bom que a senhora pode comer só com água e sal. Eu vou lhe levar um pedaço.
- Estou esperando, filho, Deus lhe abençoe.
Três dias depois, o filho volta a telefonar para a mãe. Conversam algumas banalidades. Ela faz, como de hábito, seus queixumes, mas o filho não menciona o peixe. Ela tenta lembrá-lo:
- E o peixe? Estava bom mesmo?
- Estava gostosíssimo. O peixe mais gostoso que já comi.
- Quando você vai trazer o pedaço para eu provar – ela cobra.
- Ah, mamãe! O peixe é tão bom que nós comemos até lamber os dedos. Ainda sobrou uma parte. A senhora gosta da costela?
- Gosto, sim.
- Então, vou levar para a senhora.
- Tá bom. Vou ficar esperando. Deus lhe abençoe.
Passam-se mais três dias e o filho nada de aparecer, a mãe insiste:
- Alô. E então? E a costela?
- Que costela? Ah, é a senhora, mãe.
- Você esqueceu de trazer a costela do peixe?
- Ah, mamãe! Aquele peixe era muito gostoso! Comemos e ainda ficamos com água na boca. Só sobrou a cabeça.
- É mesmo? – ela pergunta tristemente.
- A senhora quer a cabeça? Dá para fazer um caldo, não dá?
- É... dá.
- Então, eu posso levar para a senhora?
- Pode. Quando?
- Amanhã eu levo. Tchau.
- Tchau. Deus lhe abençoe.
Passaram-se dias, semanas e a mãe ainda não recebeu aquela cabeça de peixe.
_____________
Do livro "O julgamento e outras histórias"
-Alô, mãe, como estão as coisas por aí?
-Tá tudo no mesmo. Vou vivendo como Deus permite. – ela começa então a descrever seu calvário. Mas o filho não está muito disposto a ouvir a mãe se lamuriar, o que ele quer, realmente, é contar uma novidade:
- Mãe, comprei um peixe muito bonito. Deve pesar uns dez quilos. Ainda estava vivo quando comprei.
- Puxa, já faz tempo que eu não como peixe – a mãe se alegra.
- Vou levar um pedaço para a senhora. Só vendo como o peixe é bonito!
- Já estou até sentindo o gosto. Se você pudesse trazer também os temperos... Não tenho quase nada aqui para temperar.
- Hoje mandei a mulher preparar ao molho de leite de coco e amanhã vou mandar preparar com um molho especial de legumes. Mas o peixe é tão bom que a senhora pode comer só com água e sal. Eu vou lhe levar um pedaço.
- Estou esperando, filho, Deus lhe abençoe.
Três dias depois, o filho volta a telefonar para a mãe. Conversam algumas banalidades. Ela faz, como de hábito, seus queixumes, mas o filho não menciona o peixe. Ela tenta lembrá-lo:
- E o peixe? Estava bom mesmo?
- Estava gostosíssimo. O peixe mais gostoso que já comi.
- Quando você vai trazer o pedaço para eu provar – ela cobra.
- Ah, mamãe! O peixe é tão bom que nós comemos até lamber os dedos. Ainda sobrou uma parte. A senhora gosta da costela?
- Gosto, sim.
- Então, vou levar para a senhora.
- Tá bom. Vou ficar esperando. Deus lhe abençoe.
Passam-se mais três dias e o filho nada de aparecer, a mãe insiste:
- Alô. E então? E a costela?
- Que costela? Ah, é a senhora, mãe.
- Você esqueceu de trazer a costela do peixe?
- Ah, mamãe! Aquele peixe era muito gostoso! Comemos e ainda ficamos com água na boca. Só sobrou a cabeça.
- É mesmo? – ela pergunta tristemente.
- A senhora quer a cabeça? Dá para fazer um caldo, não dá?
- É... dá.
- Então, eu posso levar para a senhora?
- Pode. Quando?
- Amanhã eu levo. Tchau.
- Tchau. Deus lhe abençoe.
Passaram-se dias, semanas e a mãe ainda não recebeu aquela cabeça de peixe.
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Do livro "O julgamento e outras histórias"
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