quinta-feira, 9 de fevereiro de 2023

AMIZADES ROMPIDAS


I

 

As palavras podem ferir, ofender ou magoar os sentimentos de pessoas que vivem ao nosso redor. Também elas podem ser alentos, estímulos ou princípios pedagógicos que contribuem para o desenvolvimento da consciência, inteligência e do conhecimento pessoal. As palavras ofensivas podem tornar uma pessoa próxima infeliz, magoada por toda a sua vida. As palavras estimulantes podem tornar as pessoas próximas felizes por toda vida.

II

Charles Johnson , professor de inglês, descendente de barbadianos, chegou à cidade de Manaus. Ele havia lido em um livro de autor inglês que a maioria da população do Amazonas era descendente de inúmeros povos nativos que lutaram contra os colonizadores portugueses. Mister Jonhson viajou para outras cidades situadas no interior do Amazonas. Lecionou inglês para estudantes e professores das escolas municipais. Em uma de suas aulas, ele comentou sobre a informação que um autor inglês declarara sobre a descendência nativa da maioria da população do Amazonas. Alguns professores ficaram revoltados. Disseram que “eles nada tinham a ver com os povos que viviam na floresta.” O professor desculpou-se e disse que, com certeza, o autor do livro não conhecia, com  profundidade, a cultura da população do Amazonas. Alguns professores romperam amizade com o professor Charles Johnson.

 

III

Paulo Nascimento nasceu no Amazonas, numa cidade à beira do rio Amazonas. Seu pai, Manoel Nascimento, era português, comerciante próspero, amigo de índios, mamelucos, caboclos, negros, mulatos e de estrangeiros ou de descendentes de turcos, libaneses, judeus, árabes,  barbadianos, colombianos, peruanos e de outras gentes que viviam no Amazonas. Paulo Nascimento pensava em conhecer Portugal algum dia, mas o destino ou a sorte acabou fixando-o no solo amazônico. O destino chamava-se Lindalva, uma moça mulata, filha de um paulista e de uma maranhense, gente extremamente trabalhadora. Paulo e Lindalva tornaram-se amigos, namorados e, por fim, noivos. Paulo Nascimento comunicou aos amigos que iria casar-se com Lindalva. A maioria desses amigos parabenizaram-no, com exceção de Joaqumi Santana, filho de outro casal de portugueses. Joaquim perguntou, em tom de reprovação: “Você vai casar com essa mulher?”. Paulo Nascimento sentiu-se ofendido e respondeu: “Sim, qual é o problema? “Mas, ela é mulata”, respondeu Joaquim. Desde então, Paulo Nascimento não falou mais com Joaquim e deixou de frequentar a casa dos pais de Joaquim. Também, desistiu de conhecer Portugal.  

 

IV

 

Pedro Menezes nasceu no Rio de Janeiro. Ele era mulato. Filho de mãe branca e pai negro. Quando criança, Pedro gostava de sua mãe e de seu pai. Na verdade, ele adorava seu pai. Na adolescência, sua admiração pelo pai decresceu porque descobriu  que  ele era intolerante com seus amigos. Pedro Menezes conheceu Laura, uma estudante de medicina. Ela era branca, inteligente e estudiosa. Pedro e Laura namoraram por três anos. Pedro tornou-se escrivão da polícia. Também tornou-se crítico da sociedade em que vivia e extremamente rigoroso e competente profissionalmente. Não admitia injustiça de qualquer ordem para com os oprimidos da sociedade. Angariou, por isso, muitos inimigos na repartição onde trabalhava. Amoroso com seu pai na infância, tornou-se amargoso com ele por causa de sua atitude desrespeitosa com Gina, a sua nova namorada. Ela era negra e também amiga, carinhosa e inteligente. Um dia, seu pai lhe perguntou pela Laura. Pedro respondeu que ele e Laura romperam relações. Seu pai lhe perguntou se estava namorando “essa nega”. Pedro Menezes percebeu o tom preconceituoso de seu pai com relação à Gina. Pedro ficou mudo, olhou para o pai alguns instantes como se duvidasse que ele era realmente negro. Com certa rispidez, Pedro Menezes respondeu: “Sim, senhor meu pai, ela é minha nova namorada e vou me casar com ela, mesmo que o senhor não concorde”. Depois disso, Pedro Menezes passou a evitar seu pai e não falou mais com ele.

Logo, Pedro Menezes casou com Gina. Eles passaram a morar numa casa ao lado da casa dos pais. Muitas vezes, Pedro chegava tarde. O senhor Lourenço Menezes costumava sentar na varanda para observar a chegada do filho. Numa noite, quando seu filho chegou, o senhor Menezes chamou-o. Em tom delicado e com muita cautela, falou com o filho que ele não devia deixar Gina sozinha até tarde da noite. Pedro Menezes ficou mudo. Observou o semblante de seu pai por alguns instantes e afastou-se para a sua residência.

 

Manaus, Janeiro 2023

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