Isaac Warden Lewis
O mundo todo tomou
conhecimento da magnífica comemoração dos duzentos anos da Revolução Francesa.
A história dessa revolução tem-nos oferecido, fundamentalmente, duas versões
que são, na verdade, as duas faces dessa mesma história.
A primeira versão é a oficial,
geralmente, ensinada nas escolas e transmitida pelos meios de comunicação. Ela
nos informa que a Revolução Francesa foi realizada com o objetivo de
estabelecer princípios universais aplicáveis a todos os homens,
independentemente de sua condição social, sua raça ou sua religião. Tais
princípios afirmam que todo homem tem direito à vida, à liberdade e à
felicidade. As três palavras de ordem – liberdade, igualdade, fraternidade –
resumiriam, nessa versão oficial, os ideais da Revolução Francesa.
A outra versão é a extraoficial,
menos conhecida do grande público, diz que a Revolução Francesa, na verdade, continha,
dentro dela, várias revoluções, uma vez que classes diferentes e até
antagônicas participaram ativamente da derrubada das instituições do regime
feudal. Logo após a efetivação desse objetivo, as duas classes vencedoras se
digladiaram para estabelecer o governo e as instituições que melhor atenderiam
os seus respectivos interesses. Infelizmente, o proletariado sofreu vários
golpes e a burguesia criou governos e instituições em seu próprio benefício.
O problema, agora, é
tomarmos uma posição em relação a uma dessas versões, ou seja, estabelecermos
qual das duas seria a mais verdadeira, já que os defensores de cada uma dessas
versões consideram a sua como a verdadeira. Acreditamos que a experiência
histórica nos ajudará a nos definirmos por uma delas.
Todos nós sabemos que
os historiadores, de modo geral, referem-se ao período do terror da Revolução
Francesa em que inúmeras pessoas foram condenadas à morte, principalmente, reis
e rainhas.
Inegavelmente, esse
período reflete as lutas intestinais da revolução em que setores conservadores
e setores progressistas lutavam radicalmente para fazer valer a sua
interpretação do que entendiam por democracia, fraternidade, igualdade,
liberdade etc.
No final desse período,
emergiu vitorioso o governo de Napoleão Bonaparte que representou, na verdade,
a vitória dos interesses da classe mais poderosa e mais bem organizada naquele
momento – a burguesia francesa.
A outra etapa da
história da Revolução Francesa é a propagação dos ideais dessa revolução em
todo mundo. Ou seja, a burguesia vitoriosa inicia a guerra aos regimes feudais
da Europa, tentando revolucionar os sistemas políticos vigentes nos países
daquele continente. Nos outros continentes – África, América e Ásia – a
burguesia francesa empreende algumas conquistas, em busca de matérias-primas
para a sua indústria nascente e criando, nessas colônias, mercado para os seus
produtos industrializados. A
todos os continentes, a burguesia francesa vitoriosa levou os seus ideais, ou
melhor, a sua interpretação dos ideais de liberdade, igualdade e fraternidade
para todos os homens.
Como exemplo, veremos
como a França democrática operou, de modo geral, esses ideais, em suas colônias,
na África, no século XIX. Os franceses desembarcaram em várias regiões daquele
continente, com armas modernas, eliminaram milhares de africanos negros,
tomaram as melhores terras, criaram cidades europeizadas e urbanizadas para os
franceses brancos, apropriaram-se dos recursos naturais dessas regiões e
marginalizaram os habitantes naturais, que passaram a viver na periferia da
cidade, como cidadãos de segunda classe e como mão-de-obra explorada, segundo
os interesses dos colonizadores.
Esse exemplo, é claro,
foi seguido pela Grã-Bretanha, uma das grandes nações democráticas burguesas do
século XIX. Tanto que esses dois países entraram em guerra várias vezes para
decidir a quem caberia impor os tais ideais e interesses burgueses, nas colônias
da África, América e da Ásia. No século XX, os Estados Unidos constituem o
exemplo perfeito de vitória dos interesses e dos ideais da burguesia
internacional em todo mundo.
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Do livro “Educação:
doutrinação ou desvelamento?”