segunda-feira, 16 de junho de 2025

A MULHER, A MINISTRA E O MEIO AMBIENTE


                                                                  Lucilene Gomes Lima*



Foto: Wikipédia


As palavras revelam mais do que seus emissores desejam ou pensam revelar. O senador Plínio Valério em audiência na Comissão de Infraestrutura do Senado, no dia 27 de maio de 2025, em que interpelava a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, lhe diz: “A mulher merece respeito, a ministra, não. O senador separou o ser mulher do cargo que ela ocupa. Acaso alguém pode se separar da sua condição social, histórica, biológica para assumir um cargo? Isso precisaria ser possível para que o senador, segundo outra fala sua, pudesse enforcar somente a ministra e não a mulher.

Singularmente com a mulher ocorre o fato de se separar o que ela é profissional e socialmente de sua categoria ontológica. Na sociedade de consumismos em que vivemos, muitas vezes, as datas de vendas do comércio separam mãe, mulher, profissional. Nesse contexto, por mulher se entende apenas o sexo e sua capacidade de atração e geração. Por isso, quando alguém refere a palavra mulher precisa explicitar o que quer dizer com essa palavra.   

O senador Plínio Valério diz respeitar as mulheres porque tem seis filhas. Para ele, ter filhas, fato que, no momento de geração, não depende de sua escolha, significa respeitar mulheres. É preciso saber se ele respeita as filhas em seus estudos, suas profissões e como seres pensantes. O senador diz respeitar a ministra Marina como mulher, porém demonstra não respeitar Marina, ser histórico com inegável participação e luta nas questões ambientais, as quais motivaram toda a discussão e os desentendimentos. Marina, ser social mulher, já estava envolvida com as questões ambientais antes de ser ministra do meio ambiente. O senador Plínio finge ignorar que a mulher nunca se separou em convicção, pensamento e ação da ministra. Marina cresceu ativista ambiental, foi membra de partido político de ativismo ambiental, o Partido Verde, e fundou um partido cujo lema principal é o ativismo ambiental, a Rede Sustentabilidade, e se não merece respeito como ministra, também não é considerada confiável pelo setor do agronegócio brasileiro, daí seus embates como sindicalista, parlamentar e ministra. Marina sempre enfrentou embates nos cargos que ocupou, tendo se mantido firme em seus princípios. O senador Plínio separou Marina, ser real, histórico de seu cargo e a pôs numa categoria abstrata, a mulher. Por outro lado, o senador Plínio demonstrou, por suas próprias palavras, não respeitar nem mesmo essa categoria, uma vez que diz que a esposa o repreendeu por não a ouvir e ouvir a ministra Marina. Não é demais inferir que se o senador não ouve sua mulher, que não é ministra, pode também não a considerar nem respeitar.

Dizem que a emenda costuma sair pior do que o soneto e parece ter sido isso que ocorreu quando o senador Plínio, ao tentar se retratar por sua fala com relação à ministra Marina, disse em entrevista: “Se eu pedir desculpas para Marina não entro em casa”. Não se pode precisar o que o senador quis dizer com essa fala. Talvez signifique que ele nunca pede desculpas para sua mulher e ela, a exemplo do contexto em que o recriminou por não ter disposição de ouvi-la, não aceite a sua contradição.

O senador Plínio demonstrou covardia usando as mulheres (esposa e filhas) para se eximir da acusação de preconceito e foi oportunista e demagógico ao recorrer à pandemia de Covid 19 para justificar o descaso e o desrespeito para com o ambiente de sua terra natal. Como as palavras não estão livres do oportunismo de quem as enuncia, o senador Plínio Valério e o senador Omar Aziz se transformaram em paladinos dos direitos humanos, da compaixão humana, alardeando o desejo de salvar pessoas e, ao mesmo tempo, menosprezando a catástrofe ambiental planetária, na qual, inclusive, as pandemias podem se generalizar. Quando o senador Plínio diz que se pedisse desculpas à ministra não conseguiria se eleger nem para o cargo de vereador, indica quem são seus eleitores, mas, devido sua imprecisão vocabular, não se sabe se o que ele quis realmente comunicar é que não será reeleito porque pede desculpas a uma ministra que se posiciona a favor da preservação do meio ambiente ou porque, simplesmente, pede desculpas a uma mulher.

O senador Marcos Rogério, presidindo a Comissão de Infraestrutura, disse à ministra Marina que ela estava agindo por sexismo e depois que era mal-educada por interromper a fala dos senadores e lhes apontar o dedo, por último, disse à ministra que se colocasse no seu lugar. Todas essas acusações têm um contexto que as precederam, apesar de o senador Marcos omitir esse contexto ao se defender em plenário por suas falas e criticar o comportamento da ministra como de uma pessoa exaltada e desrespeitosa. O sexismo do qual o senador acusou a ministra foi trazido à discussão na comissão não por ela, mas pelo senador Plínio, e o desrespeito ao direito de fala foi praticado pelo próprio senador Marcos quando cortou o microfone da ministra, que respondia ao senador Omar Aziz, o qual, com tom de voz alterado e ofensivo, ao denominar a equipe do ministério de “meia dúzia de especialistas que falam besteira sobre região que não conhecem”, a acusou de não ter lhe respondido uma pergunta. O que o senador Omar finge não saber é que Marina nasceu num estado da Amazônia, o Acre, e que conhece a região como lugar de vivência, não somente como função burocrática de governo. O contexto demonstra que a ministra só alterou o tom de voz, apontou o dedo em riste e, por fim, retirou-se da audiência após ter sido sucessivamente ofendida.    

Os três parlamentares foram inábeis ou sordidamente hábeis com as palavras, apesar de ocuparem o cargo de respeitáveis senadores da República. Todos revelaram-se por suas palavras: aquele que disse que respeitava uma mulher sem, de fato, respeitá-la; aquele que menosprezou a preocupação com a segurança ambiental, qualificando-a como “conversinha de governança” e aquele que disse a uma ministra mulher qual era o seu lugar de fala – calar-se. É preciso questionar para que servem a Educação, o Congresso, o Ministério do Meio Ambiente se os senadores Omar Aziz, Marcos Rogério e Plínio Valério, dentre outros, não consideram e não respeitam os conhecimentos e os dados técnicos produzidos por especialistas brasileiros.

Longe de não ser importante a discussão sobre o gênero que a audiência possibilitou, a questão do meio ambiente é central, primeiramente, por demonstrar a capilaridade dos interesses em jogo. Um embate, na verdade, entre o grande capital e os defensores da preservação ambiental, conforme explicita na audiência a fala do senador Lucas Barreto, autor do requerimento que convidou a ministra: “[...] Nós queremos esse direito de prospectar essa riqueza que tem na costa do Amapá”. Enquanto uma ministra apresenta dados técnicos, um senador apenas diz que ela está mentindo, ecoando os interesses das empresas que extraem gananciosamente os elementos naturais, constroem estradas, administram e lucram com as frotas rodoviárias. Nesse aspecto, explica-se a confluência de propósitos dos senadores: desmoralizar o poder de voz de uma mulher e menosprezar o tema da catástrofe ambiental.   

 


 * Mestra em Estudos literários pela Universidade Federal do Pará, autora dos livros O mestre e o discípulo, O julgamento, Ficções do ciclo da borracha, A expressão literária, O produto imaginário, cofundadora da editora Mundo Novo 


sábado, 31 de maio de 2025

L A N Ç A M E N T O

 





Esse livro é composto de duas partes. Na primeira são caracterizadas as bases  constitutivas do produto imaginário na mensagem publicitária a  partir  de    concepções históricas e sociais do feminino e como esse discurso se apresenta na mensagem publicitária brasileira através da análise de anúncios elaborados nas décadas do século XX e primeira década do século XXI. Na segunda parte são analisados os veículos transmissores dos anúncios e a consequente relação ideológica entre os conteúdos das mensagens publicitárias e os conteúdos divulgados por esses veículos. 


quinta-feira, 22 de maio de 2025

(DE) CADÊNCIA

 

                                                                                                     Lucilene Gomes Lima

 

P

 

elo barulho do tecido se rasgando, ela calculou que o vestido se partira de cima a baixo. “Mais cedo ou mais tarde, isso aconteceria, Maria das Graça”’, pensou. Mas por que se chamava assim? Estava tão certa de seu infortúnio a ponto de resgatar o passado obscuro?

Chamava-se, de fato, Maria das Graças, mas mudou de nome e de vida para ser Josephine, a modelo refinada das passarelas. No tempo em que fora Maria das Graças nunca brilhara, nunca encantara plateias seletas, nunca conhecera o mundo da moda nem vestira os mais invejáveis vestidos, idealizados por geniais estilistas. Só ela sabia o que era nascer numa cidade do interior que apenas os mapas registram. Por isso, decidiu enterrar o passado. Preferiu fazer de conta que Maria das Graças nunca existira.

Então, por que se lembrar agora de que Josephine não era seu nome verdadeiro? Se tudo foi modificado para que não ficasse o mais leve sinal da existência de Maria das Graças. Mudaram-lhe a cor do cabelo, transformaram-lhe os traços do rosto, ensinaram-lhe um novo modo de falar, andar, comer, sorrir. E assim, aos poucos, ela esqueceu realmente quem era. Deslumbrou-se com o mundo da moda e passou a orientar-se somente por ele. Uma ou outra lembrança que lhe vinha da vida de outrora servia apenas para reforçar sua abjeção: a mãe chorando, debruçada à janela no dia em que ela partiu; a mãe, trajando aquele vestidinho de chita... como era triste e insignificante o mundo que ficava para trás.

Só, no camarim, buscava uma explicação para ter chegado ao ponto de descuido que chegara e, mais que tudo, buscava uma forma de salvar-se do vexame.

Calculava quanto custaria aquele vestido. Certamente não estava em jogo somente o valor em dinheiro. Sabia do temperamento do estilista que idealizara aquela peça. Ele jamais a perdoaria por tê-la destruído, menos ainda no dia em que pretendia expô-la como a grande sensação do desfile.

Não seria menor a humilhação que passaria perante as outras modelos. Sequer tinha argumentos para advogar em sua causa. Rasgara aquele vestido porque cometera o maior pecado que uma modelo poderia cometer – engordara.

Disfarçara o quanto pudera. Evitara ficar em trajes menores diante das outras a fim de que não notassem o seu corpo mais cheio. Inútil. Elas já deviam estar desconfiadas. Uma delas, inclusive, havia feito uma insinuação em forma de piada.

Indiferente ao seu drama, o desfile se inicia lá fora. Todas as modelos já estão perfiladas em frente a escada de acesso à passarela. Ela receberá a deixa para entrar por último, tática usada pelo estilista para causar maior suspense na plateia. O vestido que usa é a peça principal da coleção; falava-se pelos corredores que o estilista passara meses idealizando-o.

A fumaça produzida pelo gelo seco invade a passarela, criando uma atmosfera de mistério e, assim que se dispersa, a primeira modelo sobe, cadenciando o movimento do corpo. Seu rosto impassível lembra os dos manequins de cera das vitrines.

Josephine aguarda o momento de sua chamada. Pensa em fugir, mas não pode sair do camarim sem ser vista. Poderia, então, tentar explicar-se, buscar benevolência, compreensão. Entretanto, com o número expressivo de moças que tentam ocupar seu lugar, é pouco provável que lhe seja dada uma chance de explicação. Tais moças, com as medidas rigorosamente nos padrões, são capazes de qualquer coisa para terem uma chance de brilhar. Todas elas sonham subir as passarelas um dia e desse modo obter fama, sucesso e muito dinheiro.

Entretanto, o descarte também faz parte da carreira de uma modelo. Como qualquer produto, estão sujeitas a serem substituídas logo que se desgastem ou se tornem desinteressantes.

As modelos expõem o segundo traje da noite. Em breve, Josephine será chamada para sua entrada triunfal e única.

Ela permanece dento do camarim, a porta semiaberta, olhando o desenvolvimento do desfile, contando os minutos que lhe restam, temendo ouvir a deixa para sua entrada.

Nesses momentos que antecedem a sua desdita, antevê o futuro como um filme. Primeiramente, os contratos cancelados e o fechamento de todas as portas; depois, o retorno.

A mãe recebendo-a com o semblante de quem constata a vitória da experiência, a confirmação dos conselhos e das imprecações. E proferindo as mesmas recriminações banais. Ela sofrendo com a certeza de que se voltasse no auge da fama a acolhida seria diferente. A mãe seria, então, cúmplice de seu audacioso projeto, de sua ousada tentativa de romper o círculo em torno do horizonte pequeno e destacar-se para o mundo.

Resta-lhe saber o que levará da vida de glamour. Que significa, finalmente essa vida? Luzes, brilho, imagens. É para os outros uma imagem? Uma imagem nas capas de revistas, uma imagem na tela da televisão. Uma imagem que precisa ser alimentada continuamente de seu caráter ilusório. Sendo assim, nada poderá levar que pertença a esse mundo. A partir do momento em que se desligue dessa imagem, será apenas um ser comum, semelhante aos outros, semelhante, até, a sua mãe.

Do corredor vem a chamada inevitável. Ela respira fundo, sente-se suspensa no ar, não sente o próprio corpo. Nesse momento não há passado, não há futuro, só o receado presente.

Num estado de transe, dá alguns passos a caminho da escada. Não sabe por que caminha. Sente-se absolutamente indiferente em relação ao que vai fazer, mas seus pés se movimentam e ela vai subindo, degrau a degrau.

A plateia está em silêncio; ouve-se, ao fundo, uma música de tom exótico. Há uma excessiva claridade na passarela. Ela preferiria que tudo fosse escuridão. Os flashes das máquinas fotográficas começam a disparar antes mesmo que ela suba o último degrau.

E, logo, sem saber como chegou até ali, está sobre a passarela. Uma brisa fria lhe penetra no corpo pela extensão do vestido rasgado. Como uma vítima que olha para o algoz, ela lança um olhar de relance para o estilista. Ele parece estupefato.

Ela continua desfilando mecanicamente, julga-se ensandecida. Mas a plateia, num único gesto, transforma tudo. Aplaude vigorosamente, está embevecida, o que vê é deslumbrante.

O estilista é aclamado e sobe a passarela para receber os aplausos pela absoluta originalidade do modelo.   


terça-feira, 28 de janeiro de 2025

MEMÓRIAS DE ADORAÇÃO AO FOGO

                                                                                            Lucilene Gomes Lima 


Você não imagina como essas cenas da minha infância ainda estão vivas em minha memória. Lembro-me como se fosse hoje. Parece até que minha velha avó está me olhando com aquele seu jeito de deixar qualquer um amofinado. Se eu tinha medo dela? Claro que tinha.

Ela sempre me levava para o roçado nos dias em que ia fazer a coivara a fim de preparar a terra para a plantação de tabaco. Fazia uma grande fogueira. Uma coisa imensa para os meus olhos de criança. Eu passava um longo tempo a olhar para o fogo. O que via nele? Muitas coisas. Era superior e soberano como a minha avó. Pra mim, representava o mesmo que ela. Causava temor e admiração.

Minha avó era especialista em beliscões. Você acredita que eu ainda me lembro da dor intensa dos beliscões que ela me dava quando me recusava a tomar banho? Nunca lhe respondia malcriações, mas no meu pensamento eu a praguejava com os palavrões mais feios do mundo.

Depois, eu tinha remorso, ficava pensando se não era pecado desejar coisas tão feias para a minha avó. E ela sempre dizia que criança malcriada o diabo levava. Acho que era por isso que quase todas as noites eu sonhava que o diabo queria me levar. Como era o meu sonho? Era uma aflição danada. Parece que tudo estava acontecendo de verdade.

Você sabe como é a imagem do diabo? Num dos meus sonhos, ele apareceu com cabeça e patas de bode, pernas negras, escamas verdes, asas azuis, cabeça vermelha. Bicho pavoroso. Tinha uma força fora do comum.

Disse que ia me levar e começou a me arrastar. Eu me debati. Empreguei toda a resistência que pude para me soltar. O bicho não desistiu e tanto fez que...

Você ouviu? Esse é o meu neto, Quinzinho. Nunca sabe encontrar nada sem a minha ajuda. Aguarde um pouquinho que eu vou terminar de lhe contar como acabou o sonho.

Pronto. Já estou de volta. Em que parte eu parei? Isso mesmo. Você lembrou bem. Quando o diabo queria me levar.

Como estava contando, o bicho tinha vencido e já estava me levando para o inferno com ele, mas, nesse momento, sabe quem apareceu? Não, não foi Deus. Mas foi como se fosse.

Exatamente. Foi a minha avó. Ela apareceu toda de branco, cercada por chamas de fogo brilhantes, segurando uma cruz, e não sei com que forças me arrebatou das garras do monstro e me salvou.

Rezei muito quando acordei e venerei minha avó como se fosse santa. Depois que voltei a sentir a dor de seus beliscões, esqueci o sonho e tornei a desejar-lhe mal.

Não demorou muito e eu tive o mesmo sonho em que o diabo aparecia querendo me levar. Você já deve estar se perguntando se a minha avó me salvou. Isso eu conto depois. Primeiro, preciso contar toda a aflição que passei. Desta vez o sufoco foi maior.

Ao ver o bicho se aproximando, eu tentei escapar. Não consegui. Os meus pés não se moviam do chão. Eu não tinha forças para movimentar nenhum músculo do meu corpo. O que fiz? Fiquei parada e rezei. Rezei todos os pedaços de orações que eu sabia. Acho que rezei até coisa que nem era oração. Naquela hora, eu tinha de rezar qualquer coisa. Não teve reza que fizesse o bicho parar...

Está ouvindo? É o menino de novo. Espere só mais um pouquinho que eu vou saber o que ele está querendo.

Você está vendo como essas crianças dão trabalho? Bom, agora eu posso terminar de contar o sonho.

Como eu dizia, o bicho ia me dominar com suas garras quando, de repente, uma coisa muito estranha aconteceu. O bicho tinha se transformado na minha avó. Eu fiquei confusa. Achei que aquilo era uma arte do demônio para me iludir. Não era. Era a minha avó mesmo, e foi ela quem mais uma vez me salvou.

Passei a ter menos medo de sonhar com o demônio, confiando que minha avó sempre me salvaria. No mundo real, a história era diferente. Eu sempre a temia e até a odiava porque me aplicava castigos cruéis.

Uma noite, eu sonhei que o diabo saía das labaredas do fogo para me pegar. Tive medo. Esperei minha avó chegar para me salvar. Ela veio. E quando os dois se enfrentaram cara a cara...

Mas esse menino está-me chamando outra vez! Eu volto já.

Será que demorei muito? Você está ansioso para saber como acabou o sonho? Parei quando o diabo e minha avó estavam se enfrentando, não foi?

Você deve estar pensando que minha avó expulsou o diabo e mais uma vez me salvou. Não foi tão simples assim. De repente, diante dos meus olhos, os dois se juntaram num só corpo. Uma parte era a minha avó, outra era o diabo. Então, ficaram me puxando de um lado e de outro. Se eu me deixasse levar por minha avó, também acabava sendo levada pelo diabo. Lembro claramente desse momento de agonia, mas não lembro no que foi que resultou. Por que não me lembro? Ora, porque nesse momento eu acordei.  

* Publicado originalmente em O mestre e o discípulo (2000)