sábado, 19 de março de 2016

AS CONFUSÕES E AS CONTRADIÇÕES DA CRISE NO BRASIL


                                                                                    Isaac Warden Lewis

Há estudiosos que afirmam que as crises possibilitam aos cidadãos desenvolverem sua criatividade. Se há crise no Brasil, é preciso saber que criatividade está sendo desenvolvida pelos cidadãos que deveriam contribuir para que a grande maioria da população possa desenvolver sua criatividade, para não falar do desenvolvimento de sua inteligência.

No momento presente, é difícil entendermos o que significam alguns termos usados por cidadãos de vários setores da sociedade, inclusive intelectuais e profissionais liberais que são remunerados, em tese, para contribuir para o esclarecimento de todos os setores da sociedade. Por exemplo: Constituição, direitos constitucionais, liberdade, democracia, liberdades democráticas, bem do Brasil, república, bem da república, sigilo, presunção de inocência, estado de direito etc.

Nunca ouvi tanta manifestação a favor desses termos e conceitos por profissionais que dizem serem formados para garantir os direitos constitucionais e as liberdades individuais de todos os cidadãos brasileiros. Isso me faz lembrar pessoas presas ou sequestradas arbitrariamente pela polícia nas favelas, invasões de domicílios de trabalhadores nas favelas, escutas telefônicas realizadas nos telefones dos moradores da favela, moradores presos por cumprimentarem ou falarem ao telefone com pessoas supostamente ligadas ao crime. Nunca ouvi clamor de tais profissionais em favor dos direitos e garantias constitucionais, das liberdades democráticas e individuais contra tais arbitrariedades. São raros os profissionais liberais e intelectuais que ousam manifestar seu pensamento contra essas arbitrariedades.

O que gostaríamos de saber e pensamos que temos o direito de saber numa república, segundo a Constituição, é quem se beneficia ou se beneficiou com os desvios de dinheiro público. Se a polícia divulga quem se beneficia ou se beneficiou com o tráfico de drogas na favela, por que não se há de divulgar quem se beneficia ou se beneficiou pessoalmente ou através de partidos políticos do desvio de dinheiro de uma empresa estatal? Por que um presidente de uma comunidade favelada é condenado por possibilitar que indivíduos comercializassem drogas em sua comunidade e por que um administrador público não deve ser condenado por indicar e nomear indivíduos para desviar recursos enormes de empresas públicas? Se um suposto ou pressuposto bandido pode ser vigiado, preso, por que um funcionário ou um administrador público não pode ser vigiado, preso, como qualquer outro cidadão supostamente suspeito? Por que foro privilegiado para um bandido que desviou ou permite desvio de milhões e até de bilhões de reais ou de dólares de uma empresa pública? Afinal de contas, a Constituição qualifica bandido como bandido ou não? Um administrador público que compra uma empresa estrangeira, sangrando os recursos de uma empresa pública comete ou não improbidade administrativa? Imaginem se um diretor de uma escola pública resolve patrocinar um jogador de futebol falido em vez de utilizar os recursos financeiros para consertar a quadra de esporte da escola para que os estudantes possam praticar esporte? Esse administrador escolar comete ou não improbidade administrativa? Esse administrador deve ser ou não punido pela Justiça de nosso país? Ele deve devolver ou não o dinheiro investido no jogador de futebol falido?

Por que um morador de uma favela ou de Maricá ou um porteiro ou um pedreiro, por exemplo, não tem direito a sigilo e um morador de um sítio ou de um condomínio no Guarujá deve ter direito a sigilo? Por que este tem direito à presunção de inocência e aquele tem direito à presunção de culpa? Por que a Imprensa livre ou a Justiça imparcial pode noticiar um suposto desvio de conduta de um morador da favela ou de Maricá, de um pedreiro ou de um porteiro (segundo à ótica da polícia) e não pode noticiar um desvio de conduta de um funcionário subordinado de uma empresa estatal e dos administradores públicos que o indicaram e o nomearam? Preferimos as Constituições da Tailândia e da China que, em tese, não permitem essa tolerância, essa elasticidade de interpretações.

Que moral têm as autoridades políticas desse país para pleitear uma posição no Conselho de Segurança da ONU, se vigora um apartheid não declarado desde a proclamação do descobrimento, da independência, da república?

Que imparcialidade defendem os profissionais liberais e os intelectuais orgânicos que não consideram o projeto de um partido político, supostamente de esquerda e socializante, que adota as teorias e ações políticas de investidores internacionais, através do FMI e do Banco Mundial, em vigor desde 1964? E que, politicamente, adota medidas autocráticas utilizadas pelos senhores e senhoras escravagistas no período colonial?

Afinal de contas, o Brasil passou de colônia portuguesa a país imperial independente sob a direção dos senhores e traficantes de escravos. Depois, passou de império à república sob a direção de filhos, filhotes ou afilhados de senhores e traficantes de escravos. Por isso, ao invés de falar em estado democrático de direito, deveríamos falar de um estado burocrático de direito. Nesse caso, todas as confusões e contradições dessa crise provocada por políticos esquerdizantes e socializantes se explicam.  

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